Projeto leva ensinamento da língua indígena da tribo Maxakali para as escolas — Foto: Prefeitura de Bertópolis/Divulgação

Município do Vale do Mucuri implantou projeto para acabar com preconceito e aproximar população da tribo Maxakalis; educadores da cidade e moradores já comemoram os resultados.
Os estudantes e a comunidade do município de Bertópolis, no Vale do Mucuri, estão se adaptando a uma nova realidade, que tem contribuído para a convivência dos índios com a população da cidade. Desde abril, a língua indígena da tribo Maxakali faz parte do currículo escolar das escolas municipais de Bertópolis, que é a primeira cidade do Brasil a adotar uma língua indígena como conteúdo obrigatório nas escolas.A cidade tem cerca de 4.602 habitantes, de acordo com o último censo realizado pelo IBGE. São mais de 1 mil índios Maxakalis, que residem no distrito de Umbaradinha, mas estão sempre na área urbana para serviços de saúde, trabalho, escola, etc. Apesar dessa convivência diária, os moradores ainda enxergavam a tribo com distância e certo preconceito.

“A população muitas vezes julgava os índios como violentos. Por mais que os índios estavam sempre aqui na cidade, e as pessoas soubessem da existência deles, faltava conhecer para que pudesse haver o respeito e a valorização da população. Então nosso objetivo com esse projeto foi justamente esse, trazer a realidade indígena para as escolas”, explica a assistente social da Prefeitura de Bertópolis, Aurora Bahia.

O primeiro passo do projeto foi o ensinamento da cultura Maxakali como educação patrimonial. Depois surgiu a ideia de inserir na grade curricular das escolas. Segundo Aurora Bahia, os índios aprenderam o português para poder frequentar as escolas do município, se adaptando à forma de vida da cidade. Agora, a ideia é fazer o inverso e mostrar para a população da cidade como é a cultura dos índios.
“A língua é uma das maiores riquezas que eu povo tem. Se nós passamos a ensinar a língua indígena dentro da sala de aula, os índios se sentem pertencentes da nossa realidade e isso melhora diretamente a relação”, afirma.

Implantação do projeto
Antes da inclusão da matéria no currículo escolar, foi feito um trabalho de intercâmbio entre os índios e os demais moradores da cidade. De acordo com o secretário de Educação, Luiz Salomão, a receptividade das crianças foi satisfatória. “Foi um trabalhado com reuniões com os pais e alunos para explicar como iria ser essa implantação. Os alunos ficaram super entusiasmados com essa nova matéria, criança gosta muito de apreender, tem curiosidade. Os alunos receberam essa notícia com muito entusiasmo”.

A disciplina que ensina a língua indígena da tribo Maxakali, foi batizada de Cultura Indígena e está incluída nas matérias da área de humanas e suas tecnologias. As aulas são aplicadas nas duas escolas municipais da cidade, uma vez por semana.

Para Reginaldo Maxakali, um dos chefes da tribo, já é perceptível as melhorias na convivência da população, desde a implantação do projeto. “Fiquei muito feliz. É muito importante ter amizade com o povo indígena. O índio ajuda o não índio e o não índio ajuda o índio. Nós todos somos iguais, o nosso sangue é o mesmo sangue”.

Damasinho Maxakali é um dos professores da turma — Foto: Prefeitura de Bertópolis/Divulgação

As aulas são aplicadas por índios que são professores dentro da tribo. Assim como os professores das escolas, eles também passam por treinamentos para aplicar as matérias de forma mais didática para os alunos. Damasinho Maxakali, um dos primeiros professores do projeto, explica que para prender a atenção dos alunos usa desenhos e brincadeiras.

“Durante a aula eu uso desenhos para os alunos conseguirem associar e aprender de forma mais rápida. As palavras são bem diferentes para quem ainda não tem costume, mas com brincadeiras e jogos fica fácil de aprender. Eu ensino músicas também, que são formas mais fáceis de gravar as palavras e eles ficam com a música na cabeça”, explica.

Ainda de acordo com o professor, o objetivo da aula é trazer a língua Maxakali para o cotidiano dos alunos. Por isso, ele ensina nome de frutas, animais, objetos e mostra aos alunos como escrever e pronunciar corretamente as palavras na língua da tribo. “Eu levo desenhos para a sala de aula e eles têm que colocar o nome Maxakali e português. Além de aprender uma nova língua eles reforçam as outras matérias. Uma das primeiras coisas que eles aprenderam foi o nome de alguns animais domésticos. Gato é mêôg e cão é tochuckschauam”.

Damasinho Maxakali ressalta que o mais importante nessa interação não é de fato os alunos aprenderem a língua, mas a convivência. “Aprender a língua é só um consequência de toda a convivência da sala de aula, do conhecimento da cultura indígena e da troca de culturas. Esses alunos agora vão ser um dos responsáveis por cuidar e repassar a cultura indígena”, conclui o professor.

Aulas são ministradas com uso de objetos demonstrativos — Foto: Prefeitura de Bertópolis