Foto: Yasuyoshi Chiba/AFP/JC

Ao trazer o tema, o samba enredo chamado “Xingu, o clamor da floresta”, provocou a ira do setor de agronegócios no Brasil.

No enredo, a escola traz à tona temas como o desmatamento, o uso indevido de agrotóxicos e as consequências da usina de Belo Monte.

“Jardim sagrado o caraíba descobriu

Sangra o coração do meu Brasil

O belo monstro rouba as terras dos seus filhos

Devora as matas e seca os rios

Tanta riqueza que a cobiça destruiu”

“Chamamos a atenção para o medo e a preocupação permanentes dos xinguanos, que a cada noite temem uma nova invasão de suas terras”, escreveu o carnavalesco em um post que defende o enredo no Facebook. “Ou imaginam a catástrofe que a usina de Belo Monte desencadeará no ecossistema de toda aquela região, inundando aldeias, igarapés e levando na força de suas águas as chances de sobrevivência de sua gente. Tive a oportunidade de ver isso pessoalmente. Conversei com eles, ouvi a sua angústia.”

Cahe Rodrigues em sua passagem pelo Xingu

Perguntado sobre suas expectativas para a folia, o carnavalesco diz que quer deixar a reflexão na avenida e promover o debate sobre o tema. “No Carnaval temos uma mídia espontânea muito grande e uma exposição mundial, até porque ele é transmitido para cerca de 180 países, então, quando você leva uma reflexão para avenida, é sempre muito pertinente.”

“Espero que as pessoas analisem a questão do índio no Brasil. [Queremos] Dar voz a eles, mostrar o que mais importa desse enredo é o respeito. Eles são nossos irmãos e vivem uma realidade nua e crua de perseguição, de ameaças constantes por conta de suas terras. Então, acho que toda forma de exaltação e respeito ao próximo é válido e é isso que a imperatriz vai fazer.”

A Imperatriz Leopoldinense é a terceira escola a desfilar no próximo domingo (26) na Marquês de Sapucaí. O desfile começa a partir das 22 horas.

Oposição e críticas

Assim que o tema foi divulgado, a escola recebeu inúmeras críticas de associações do agronegócio. Em nota, a Associação Brasileira dos Criadores de Zebu afirmou que repudia, “com indignação e veemência”, o samba-enredo, pois este “critica duramente o agronegócio” e mostra “total despreparo e ignorância quanto à história brasileira brasileira e à realidade econômica e social do País.”

Além dela, a Sociedade Rural Brasileira, Associação Brasileira dos Criadores de Girolando e a Associação Brasileira dos Criadores do Cavalo Mangalarga Marchador.

A história também rendeu um desabafo discriminatório e extremamente preconceituoso da jornalista Fabélia Oliveira, do programa “Sucesso do Campo”. Em uma transmissão ao vivo, a apresentadora repreendeu o samba-enredo da escola e disse que índio “de verdade” tem que morrer de “malária, de tétano e do parto.”

“Índio que quer preservar sua cultura não pode ter acesso à tecnologia que nós temos”, disparou. “Não pode comer de geladeira, tomar banho de chuveiro e tomar remédios químicos porque há um controle populacional natural — ele vai ter que morrer de malária, de tétano, do parto. É, a natureza.”

O carnavalesco Cahe Rodrigues rebateu as críticas em um post no Facebook. “Quando a Imperatriz Leopoldinense decidiu levar para a Avenida o enredo ‘Xingu, o clamor que vem da floresta’ assumiu o desafio de apresentar muito mais que um desfile voltado à cultura e às tradições das etnias indígenas que ocupam o coração do Brasil. (…) Ao longo dos séculos, aprendemos que o povo brasileiro é resultante de três raças: o índio, o negro e o branco. No entanto, nossa História sempre foi contada pelos brancos, pois negros e índios raramente tiveram a chance de expressar tudo que tiveram de enfrentar para ajudar a construir essa História. Infelizmente, pouco sabemos sobre eles.”

Ele continua dizendo que o objetivo foi fazer o alerta sobre os riscos que ainda ameaçam as 16 etnias que moram na reserva e, indiretamente, outras espalhadas pela Amazônia. Combatemos sim, em nosso enredo, o uso indevido do agrotóxico, que polui os rios, mata os peixes e coloca em risco a vida de seres humanos, sejam eles índios ou não, alem de trazer danos em alguns casos irreversíveis para nossa fauna e flora.”

Reprodução/Facebook/ Cahe Rodrigues